Disparada
Prepare o seu coração
Pras coisas que eu vou contar
Eu venho lá do sertão
Eu venho lá do sertão
Eu venho lá do sertão
E posso não lhe agradar
Aprendi a dizer não
Ver a morte sem chorar
E a morte, o destino, tudo
A morte e o destino, tudo
Estava fora do lugar
Eu vivo pra consertar
Na boiada já fui boi
Mas um dia me montei
Não por um motivo meu
Ou de quem comigo houvesse
Que qualquer querer tivesse
Porém por necessidade
Do dono de uma boiada
Cujo vaqueiro morreu
Boiadeiro muito tempo
Laço firme e braço forte
Muito gado, muita gente
Pela vida segurei
Seguia como num sonho
E boiadeiro era um rei
Mas o mundo foi rodando
Nas patas do meu cavalo
E nos sonhos
Que fui sonhando
As visões se clareando
As visões se clareando
Até que um dia acordei
Então não pude seguir
Valente em lugar tenente
E dono de gado e gente
Porque gado a gente marca
Tange, ferra, engorda e mata
Mas com gente é diferente
Se você não concordar
Não posso me desculpar
Não canto pra enganar
Vou pegar minha viola
Vou deixar você de lado
Vou cantar noutro lugar
Na boiada já fui boi
Boiadeiro já fui rei
Não por mim nem por ninguém
Que junto comigo houvesse
Que quisesse ou que pudesse
Por qualquer coisa de seu
Por qualquer coisa de seu
Querer ir mais longe
Do que eu
Mas o mundo foi rodando
Nas patas do meu cavalo
E já que um dia montei
Agora sou cavaleiro
Laço firme e braço forte
Num reino que não tem rei
Na boiada já fui boi
Boiadeiro já fui rei
Não por mim nem por ninguém
Que junto comigo houvesse
Que quisesse ou que pudesse
Por qualquer coisa de seu
Por qualquer coisa de seu
Querer ir mais longe
Do que eu
Mas o mundo foi rodando
Nas patas do meu cavalo
E já que um dia montei
Agora sou cavaleiro
Laço firme e braço forte
Num reino que não tem rei
Disparada: A Jornada de Um Homem Sertanejo e a Reflexão Sobre Liberdade
A música Disparada, composta por Geraldo Vandré, é uma das obras mais emblemáticas da música popular brasileira, especialmente por sua associação com o período da ditadura militar no Brasil. A canção, que se tornou um hino de resistência, traz uma narrativa que se desdobra em metáforas sobre a vida, a liberdade e a condição humana, utilizando o universo do sertão e da boiada como pano de fundo para suas reflexões.
O eu lírico começa contando que vem do sertão e que pode não agradar a todos com suas palavras. Essa introdução serve como um aviso de que o que será dito é fruto de uma experiência de vida árdua e realista, marcada pela necessidade de dizer 'não' e pela familiaridade com a morte. A repetição da frase 'Eu venho lá do sertão' reforça a identidade do narrador e a origem de suas vivências. A menção à morte e ao destino 'fora do lugar' sugere um mundo desordenado, que o narrador sente a necessidade de 'consertar', indicando um desejo de mudança e justiça.
A segunda parte da música descreve a transformação do narrador de boi para boiadeiro e, posteriormente, para cavaleiro. Essa progressão simboliza uma jornada de autoconhecimento e empoderamento. O narrador deixa de ser parte da boiada, passivo e submisso, para se tornar alguém que guia e tem controle sobre seu destino. A frase 'Mas com gente é diferente' destaca a consciência do narrador sobre a complexidade das relações humanas em contraste com a simplicidade do trato com o gado. A música termina com uma declaração de independência, onde o narrador, agora cavaleiro, reconhece que não há rei em seu reino, uma metáfora para a liberdade e a igualdade entre as pessoas.
Disparada é uma canção que fala sobre a busca pela liberdade e a recusa em ser dominado ou manipulado, seja por outros indivíduos ou por sistemas opressores. Geraldo Vandré, com sua poesia carregada de simbolismo e crítica social, convida o ouvinte a refletir sobre a própria vida e as estruturas de poder que nos cercam, fazendo desta música um clássico atemporal da música brasileira.