Café
Colônia! Teus filhos já estão de pé
Mais um dia se inicia na colheita do café
Pesado é o fardo – e o gosto amargo
Sombras do passado pairam sobre o cafezal
Vastos campos, vilas e aldeias
Devastadas jazem sob a imensa plantação
Mágoas que o roçado semeia
Semeia
Braços baratos, curvados
Em nome de um grão
Pisados, moídos, pilados
No corpo carregam impressas
As farpas, os prantos, os calos
As marcas das veias abertas
Sombras do passado, cantos, vozes ancestrais
Movimentam rios profundos
Brota no silêncio o sopro da revelação
Que faz do grão vermelho o espelho dos mundos
Como se o tempo se abrisse
Na palma da mão
E um arco bordado de fogo
No céu costurou lado a lado
Os elos da eterna cadeia
Presente, futuro e passado
Como quem vê
O horizonte a se alargar
Como quem vê
Que além do monte desagua o mar
Um barco grande leva a dor além
Um cais distante avante marcha um trem
A luz vibrante da capital
À luz de velas um casal
Um café em paris
Num café em paris
Feliz! Nada como estar em paz, a sós
Feliz! O universo a conspirar por nós
Perfumada é a flor do bem-estar
Não existe outro lugar, somente agora e aqui
Feliz! Nada como estar a sós, em paz
Feliz! Uma flor, uma canção e nada mais
Lindo instante pra se eternizar
Hoje o mundo se rendeu
Só pra você e eu
Colônia! Teus filhos já estão de pé
Grãos vermelhos se incendeiam na colheita do café
Ondas de revolta, se levanta o cafezal
Pela terra e suas riquezas
Bomba contra foice, metralha contra facão
Sangra a insurreição camponesa
Punhos cerrados, tragados
Pra baixo do chão
Sinistra e amarga colheita
Semeada por grão de chumbo
Os elos da triste cadeia
O horizonte além do monte
O mar vibrante, um cais distante
A dor da terra avante a se espalhar
Abrem-se as cortinas no cenário de cristal
O brilho da bandeja rumo à mesa do casal
Um gole, um gosto amargo impossível de engolir
Um gesto de repulsa faz a xícara cair
E a fina porcelana se estraçalha contra o chão
Um rasgo de navalha no veludo da ilusão
E a poça sobre o mármore harmoniza um novo tom
Colônia
Se espalha pelo chão, o espelho da vergonha
E a mancha no salão por fim completa a cena
Do líquido no chão, revela-se um poema
A flor do bem-estar se rega com o suor da escravidão!