Dias de Santos e Silvas

Gonzaguinha

O dia subiu sobre a cidade
Que acorda e se põe em movimento
Um despertador bem barulhento
Badala, bem dentro, em meu ouvido

Levanto, engulo o meu café
Corro e tomo a condução
Que, como sempre, vem cheia,
Anda, para e me chateia

Está quente pra chuchu,
Meu calo dói,
A certeza já me rói,
Levo bronca do patrão

Mas, sonhei
E fiz a fé no avestruz
Que vai me dar uma luz
Levo uma nota pra mão

A tarde transcorre calma e quente
Nas ruas, ao sol, fervilha gente
Batalham, como eu, o leite e o pão
Que o gato bebeu e o rato roeu

Aumenta tudo, aumenta o trem
Aumenta o aluguel e a carne também
É... mas, sei, vai melhorar
Pior que tá não dá pra ficar

Ah, meu deus,
Se o avestruz der na cabeça
Vou ganhar dinheiro à beça,
Faço minha redenção

E vou lá dentro,
No escritório do patrão
Peço aumento, ele não dá,
Mostro a grana e a demissão

A noite desceu sobre a cidade
Nas filas, calor suor cansaço
Meu corpo está que é só bagaço
E se está de pé é de teimoso

Eu, desejando minha cama
Furam a fila e alguém reclama:
Louvaram a mãe do rapaz
Que diz que faz e desfaz

E só falta uma briguinha
E eu ir para o xadrez
Pobre não tem mesmo vez
Não dá sorte ou dá azar

E o danado do avestruz
Também não deu
Minha mulher vai reclamar
O dinheiro que era seu

E o danado do avestruz
Também não deu
Minha mulher vai reclamar
O dinheiro que era seu

Que o gato comeu
O rato roeu
Alguém se lambeu

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