Consolo Na Praia
Vamos, não chores
A infância está perdida
A mocidade está perdida
Mas a vida não se perdeu
O primeiro amor passou
O segundo amor passou
O terceiro amor passou
Mas o coração continua
Perdeste o melhor amigo
Não tentaste qualquer viagem
Não possuis carro, navio, terra
Mas tens um cão
Algumas palavras duras
Em voz mansa, te golpearam
Nunca, nunca cicatrizam
Mas e o humor?
A injustiça não se resolve
À sombra do mundo errado
Murmuraste um protesto tímido
Mas virão outros
Tudo somado
Devias precipitar-te, de vez, nas águas
Estás nu na areia, no vento
Dorme, meu filho
A Poesia Como Refúgio: Uma Análise de Consolo Na Praia
A poesia Consolo Na Praia, de Carlos Drummond de Andrade, um dos maiores poetas da literatura brasileira, traz uma reflexão profunda sobre a vida e suas perdas inevitáveis. O poema é um diálogo íntimo, quase um monólogo consolador, onde o eu lírico parece falar consigo mesmo ou com um interlocutor muito próximo, talvez um filho, como sugere o último verso. A mensagem é de aceitação das perdas e de valorização do que permanece, apesar dos reveses da vida.
A estrutura do poema é construída em torno de contraposições entre o que foi perdido e o que ainda resta. A infância, a mocidade, os amores e até a amizade são apresentados como partes da vida que se foram. No entanto, o coração que continua batendo, a presença de um cão como companhia e o humor são elementos que sugerem uma resiliência inerente ao ser humano. A repetição da palavra 'passou' enfatiza a transitoriedade das experiências, enquanto a permanência do coração sugere uma essência que sobrevive às perdas.
O poema também aborda a dor causada por palavras duras e a sensação de impotência diante das injustiças do mundo. Ainda assim, o eu lírico encoraja a resistência, a esperança de que 'virão outros' momentos ou oportunidades de protesto e mudança. A imagem final do poema, de estar 'nu na areia, no vento', evoca uma sensação de vulnerabilidade e exposição, mas também de liberdade e renovação, como se, ao se despir de tudo o que é supérfluo, o indivíduo pudesse encontrar um consolo genuíno na simplicidade da existência. 'Dorme, meu filho' pode ser interpretado como um convite a descansar e se recuperar das adversidades, preparando-se para o que está por vir.