Assim Canta Um Cantor de Campo
Assim, por cantor de campo
Bordoneando esta guitarra
Abro peito igual cigarra
E nesta milonga me acampo
Assim, por cantor de campo
Que só tem a pretensão
De cantar o seu rincão
O seu povo e sua existência
Me entropilho com a essência
Que tenho por tradição
Assim canta este cantor
Que aprendeu a ser liberto
Cantando o campo aberto
E as noites de lua em flor
Pois quem canta por amor
É livre, não se aprisiona
E somente se apaixona
Por coisas da sua estima
Se entre o pulsar da prima
Vibram a quarta e a bordona
Sou cantor que sem falquejo
Aprendeu nos corredores
A cantar os seus amores
E o sabor de cada beijo
Cantando, me fiz andejo
Cruzando dum pago a outro
Do vento, escutando o sopro
Da sanga, o murmúrio manso
Só pra rimar com o balanço
Do corcovo de algum potro
Das tardes quentes, branindo
Canto o frescor das aguadas
Das manhãs brancas de geadas
Canto o sol, manso, surgindo
E das madrugadas, sorrindo
Com o garganteio dum galo
Canto a cadência do embalo
Que traz arrastos de esporas
Quando ecoam na aurora
Gritos de forma cavalo
Este cantar não tem dono
Mas carrega as vibrações
Dos que vivem nos fundões
E são herdeiros do trono
Que o gaúcho com entono
Guarda de garrão trancado
Sempre de pingo encilhado
E laço atado nos tentos
Sustentando o fundamento
De andar de chapéu tapeado
Assim, por cantor de campo
Cantarei a minha sina
E algum fiapo de crina
Que a vida prende num grampo
Assim, por cantor de campo
Com esta guitarra, sem luxo
Pronto pra qualquer repuxo
Atento ao grito de pega
Eu tranco o pé na macega
E honro o canto gaúcho