Vida Loka (parte 2)
(Firmeza total, mais um ano se passando aí)
(Graças a Deus a gente tá com saúde aí, morô?)
(Muita coletividade na quebrada, dinheiro no bolso)
(Sem miséria, e é nós)
(Vamo brindar o dia de hoje)
(Que o amanhã só pertence a Deus)
(A vida é loka)
Deixa eu falar procê
Tudo, tudo, tudo vai, tudo é fase, irmão
Logo mais vamo arrebentar no mundão
De cordão de elite, 18 quilates
Põe no pulso logo um Breitling
Que tal? Tá bom?
De lupa Bausch & Lomb
Bombeta branco e vinho
Champagne para o ar, que é pra abrir nossos caminhos
Pobre é o diabo, eu odeio ostentação
Pode rir, ri, mas não desacredita, não
É só questão de tempo o fim do sofrimento
Um brinde pros guerreiro, zé povinho eu lamento
Vermes que só faz peso na Terra
Tira o zóio, tira o zóio, vê se me erra
Eu durmo pronto pra guerra e eu não era assim
Eu tenho ódio e sei que é mal pra mim
Fazer o que se é assim? Vida loka, cabulosa
O cheiro é de pólvora e eu prefiro rosas
E eu que, e eu que sempre quis um lugar
Gramado e limpo, assim, verde como o mar
Cercas brancas, uma seringueira com balança
Desbicando pipa, cercado de criança
How, how, Brown
Acorda, sangue bom
Aqui é Capão Redondo, tru, não Pokemón
Zona sul é invés, é stress concentrado
Um coração ferido por metro quadrado
Quanto mais tempo eu vou resistir?
Pior que eu já vi meu lado bom na UTI
Meu anjo do perdão foi bom, mas tá fraco
Culpa dos imundo do espírito opaco
Eu queria ter pra testar e ver
Um malote com glória, fama, embrulhado em pacote
Se é isso que cês quer, vem pegar
Jogar num rio de merda e ver vários pular
Dinheiro é foda
Na mão de favelado é mó goela
Na crise, vários pedra-noventa esfarela
Eu vou jogar pra ganhar, o meu money vai e vem
Porém, quem tem, tem
Não cresço o zóio em ninguém
O que tiver que ser, será meu
Tá escrito nas estrelas, vai reclamar com Deus
Imagina nós de Audi ou de Citröen
Indo aqui, indo ali, só pam, de vai e vem
No Capão, no Apurá, vou colar
Na Pedreira do São Bento
Na Fundão, no pião, sexta-feira
De teto solar, o luar representa
Ouvindo Cassiano, hah, os gambé não guenta
É, mas se não der, nego, o que é que tem?
O importante é nós aqui junto ano que vem
E o caminho da felicidade ainda existe
É uma trilha estreita, é em meio à selva triste
Quanto cê paga pra ver sua mãe agora
E nunca mais ver seu pivete ir embora?
Dá a casa, dá o carro, uma Glock e uma FAL
Sobe cego, de joelho, mil e cem degrau
Quente é mil grau o que o guerreiro diz
O promotor é só um homem, Deus é o juiz
Enquanto zé povinho apedrejava a cruz
E o canalha, fardado, cuspiu em Jesus
Ó, aos 45 do segundo, arrependido
Salvo e perdoado é Dimas, o bandido
É louco o bagulho, arrepia na hora, ó
Dimas, primeiro vida loka da história
Eu digo: Glória, glória, sei que Deus tá aqui
E só quem é, só quem é vai sentir
E meus guerreiro de fé
Quero ouvir, quero ouvir
E meus guerreiro de fé
Quero ouvir, irmão
Programado pra morrer nós é (ao lado direito do Pai)
Certo é certo é crer no que der (é quente)
Firmeza, não é questão de luxo, não é questão de cor
É questão que fartura alegra o sofredor
Não é questão de preza, nego, a ideia é essa
Miséria traz tristeza e vice-versa
Inconscientemente vem na minha mente inteira
Na loja de tênis, o olhar do parceiro feliz
De poder comprar o azul, o vermelho
O balcão, o espelho, o estoque, a modelo
Não importa, dinheiro é puta e abre as portas
Dos castelos de areia que quiser
Preto e dinheiro são palavras rivais, é?
Então mostra pra esses cu como é que faz
O seu enterro foi dramático como um blues antigo
Mas de estilo, me perdoe, de bandido
Tempo pra pensar, quer parar? Que cê quer?
Viver pouco como um rei ou muito como um zé?
Às vezes eu acho que todo preto como eu
Só quer um terreno no mato só seu
Sem luxo, descalço, nadar num riacho
Sem fome, pegando as fruta no cacho
Aí, truta, é o que eu acho, quero também
Mas em São Paulo Deus é uma nota de 100
Vida loka
Porque o guerreiro de fé nunca gela
Não agrada o injusto e não amarela
O Rei dos reis foi traído e sangrou nessa terra
Mas morrer como um homem é o prêmio da guerra
Mas ó, conforme for, se precisar
Afogar no próprio sangue, assim será
Nosso espírito é imortal, sangue do meu sangue
Entre o corte da espada e o perfume da rosa
Sem menção honrosa, sem massagem
A vida é loka, nego
Nela eu tô de passagem
A Dimas, o primeiro
Saúde, guerreiro!
Dimas, Dimas, Dimas
A Resistência e a Esperança em Vida Loka (Parte 2) dos Racionais MC's
A música 'Vida Loka (Parte 2)', dos Racionais MC's, é um retrato visceral da realidade enfrentada por muitos moradores das periferias brasileiras, especialmente em São Paulo. A letra, carregada de emoção e crítica social, é um manifesto sobre a luta pela sobrevivência, a busca por dignidade e a resistência contra as adversidades impostas pelo sistema. Os Racionais MC's, grupo de rap formado na década de 1980, é conhecido por suas letras que abordam a violência, o racismo e a desigualdade social, sendo uma voz ativa na cultura hip-hop nacional.
A letra de 'Vida Loka (Parte 2)' fala sobre a ambição de superar a pobreza e alcançar uma vida melhor, sem esquecer as origens e os desafios enfrentados no dia a dia. O desejo por itens de luxo, como correntes de ouro e relógios caros, é mencionado como uma forma de escapismo e uma tentativa de reverter o estigma associado à pobreza. No entanto, a música também reflete sobre o preço dessa ambição, questionando se vale a pena viver pouco como um rei ou muito como um 'zé', ou seja, uma pessoa comum.
A referência a Dimas, 'o primeiro vida loka da história', alude ao ladrão arrependido que foi crucificado ao lado de Jesus e perdoado por ele. Essa menção serve para reforçar a ideia de redenção e a crença na justiça divina, em contraste com a injustiça humana. A música termina com uma mensagem de força e resiliência, afirmando que o espírito é imortal e que, apesar das dificuldades, a vida é passageira e deve ser vivida com honra e coragem. 'Vida Loka (Parte 2)' é um hino de esperança para aqueles que enfrentam a dura realidade das ruas, lembrando-os de que a luta continua e que a fé é um elemento crucial para a sobrevivência.